sexta-feira, 24 de julho de 2009

OS DIAS DE CUIMBA

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MEMÓRIA
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ENTRELINHAS DE UMA MEMÓRIA
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OS DIAS DE CUIMBA 10
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Ainda sobre estes “valentes” soldados do 782, não resisto a contar uma das peripécias mais hilariantes que vivenciei em Cuimba.
Os postos de sentinela ou de reforço tinham uma cama instalada para serem ocupados por dois soldados sempre que nos chegassem suspeitas de possíveis ataques ao aquartelamento. Nessas noites apagavam-se todas as luzes, ficava escuro como breu e ninguém via ninguém.
A ideia era que os dois homens se revezassem (enquanto um vigiava, o outro descansava), tornando-os assim mais confiantes.Naquela noite ouvimos alguém gritar bem alto por socorro, parecia-nos mais do que uma voz soando nas imediações da nossa casa. Levantámo-nos de supetão, ao mesmo tempo que nos interrogávamos: o que poderia ter acontecido? Abrimos a porta na tentativa de descobrir algo, mas a escuridão era total.
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Foto: José Mesquita
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Nada se viu, nada mais se ouviu e a normalidade voltou. Na manhã seguinte nem foi preciso indagar, já que era o tema das bem humoradas conversas à mesa do pequeno-almoço.
Terá acontecido que dois “maçaricos” de vigia estavam superassustados. O que àquela hora descansava adormeceu, no seu subconsciente o medo mantinha-se, sonhou que estava a lutar com um “turra”, rolou e caiu da cama. Estava confuso, traumatizado pela queda e não sentia o braço sobre o qual dormira.
Por sua vez, o soldado de vigia não via nada ao seu redor, mas ouviu muito bem o colega cair e gritar que lhe tinham cortado um braço…
Tomados pelo pânico, desorientados na escuridão, aos dois “valentes” sentinelas nada mais ocorreu que abandonar o posto e gritar por socorro.Lentamente, a vida em Cuimba voltou à rotina habitual. Os meus escritos apenas salientam que as colunas do 782 se esqueciam sistematicamente do nosso correio.
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Este facto causava-nos algum desconforto, desconfiávamos até que poderia ser intencional, dado que os homens do novo Batalhão não encaravam com naturalidade o facto de a equipa da escuta ser autónoma, não integrar a escala de serviço, nem tão-pouco comparecer na formatura para as refeições.
A 26 de Junho comemora-se o dia da Cavalaria e tal facto constituiu uma salutar “pedrada no charco” na apatia do 782.
O avarento comandante decidiu celebrar condignamente o dia da sua Arma. Abriu os cordões à bolsa e, ao almoço, fomos agradavelmente surpreendidos com a ementa: nem mais nem menos que leitão e batatas fritas.
Foi o que se pode chamar um “bodo aos pobres”, mas logo retornámos à normalidade, ou seja, à má alimentação.
A nós, homens da escuta, restava-nos a satisfação do dever cumprido, dado estarem já ultrapassados os seis meses da missão. Alegrava-nos também o facto de o capitão Guerreiro ter regressado a Luanda.

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Continua




3 comentários:

:.tossan® disse...

Gosto do teu blog porque é ecléctico, posso desfrutar de óptimas photos e belas histórias importantes. Abraço

Anónimo disse...

Palanca branca era um bom pitéu. A preta era absolutamente proibido matar.
Lembro-me de meu Pai ter tido graves problemas porque lhe ofereceram umas imponentes hastes de palanca preta e alguém denunciou que ele as tinha em casa.
Foram oferecidas ao Clube de Caçadores de Angola. A cabeça da palanca preta era o emblema do clube.
Quem sabe onde estarão agora...

Gaspar de Jesus disse...

Obrigado TOSSAN
É muito agradável para mim saber que as minhas memórias lhe agradam.

Pois é JORGE, a roda do tempo é implacável! Onde estará o precioso"trofeu"?
Mas concordo consigo, a carne destes animais bravios era uma maravilha.
Grande abraço aos dois
G.J.
Grande abraço
G.J.

5ª TERTÚLIA A 02 DE JULHO

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COM A ARTE NO OLHAR